A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) divulgou recentemente o relatório da Avaliação Trienal 2007. De acordo com o documento, foram avaliados 2.266 programas, totalizando 3.409 cursos, 1.182 de doutorado, 2.070 de mestrado acadêmico e 157 de mestrado profissional. Foram contabilizados 41.646 alunos titulados, 77,5% em mestrado e 22,5% em doutorado. Já quando se trata de alunos matriculados o número chega à 132.481, cerca de 64% de mestrandos e 36% de doutorandos. Houve um aumento de cerca de 20% dos programas avaliados em relação ao relatório anterior de 2004.
O documento visa avaliar a evolução de todo o sistema de pós-graduação do país e de cada programa individualmente, possibilitando a implantação de um banco de dados eficiente acerca da situação e evolução da pós-graduação, além de possibilitar a autorização, reconhecimento e renovação do reconhecimento dos cursos de mestrado e doutorado brasileiros.
A avaliação do Relatório Trienal se dá através de conceitos que vão de 1 a 7, estes números correspondem, em ordem crescente de qualidade dos cursos, os cursos classificados com os conceitos 1 ou 2 tiveram um desempenho fraco e abaixo do padrão mínimo, ao passo que os que obtiveram 6 ou 7 são aqueles programas de doutorado com nível de excelência. Dos programas avaliados 0,3% tiveram conceito 1, 3,7% obtiveram conceito 2, 29,9% foram classificados com conceito 3, a maioria dos programas tiveram conceito 4, cerca de 35,3%, o relatório registrou 21,1% com conceito 5, 6,4% foram avaliados com 6 e apenas 3,3% alcançaram o conceito máximo.
Avaliação qualitativa dos resultados
Os novos números da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) indicam um crescimento quantitativo considerável acerca da pesquisa científica brasileira. Há 20% a mais de programas de pós-graduação, porém ao analisar os dados de uma forma qualitativa, a coisa muda de figura e pode-se ver de uma forma mais consistente e visível as falhas da pesquisa no Brasil. Tendo como parâmetro os conceitos de 1 a 7 dados pela Capes em comparação com a Avaliação Trienal anterior, percebe-se que o panorama não se modificou, de fato, como indicam os números analisados.
A porcentagem de cursos com o conceito 1 permaneceu em 0,3%, no entanto houve um aumento em relação àqueles que receberam o conceito 2, em 2004 eram 1,7%, agora chegaram a 3,7%. O que indica que há mais cursos de péssima qualidade do que antes. Já os que obtiveram conceito 3, houve um decréscimo de 30,1% para 29,9%. O conceito 4 continua sendo o concedido com mais freqüência, aumentando de 32,5% para 35,3%. Os programas classificados com o conceito 5 diminuíram de 24% para 21,1%. Os cursos atestados como de ótima qualidade diminuíram em relação ao relatório anterior, aqueles com conceito 6 consistiam em 8% do total e agora não passam de 6,4%, enquanto os que obtiveram conceito 7 têm uma participação semelhante ao da última avaliação, passaram de 3,4% para 3,3%.
Embora o crescimento em números seja evidente, os programas em nível de excelência (conceitos 6 e 7) tiveram um crescimento absoluto ínfimo, em 2004 existiam 207 e agora são 219 cursos considerados de ótima qualidade. Outro dado desanimador é que há um número muito maior em relação aos programas de péssima qualidade, (conceitos 1 e 2) houve um aumento de 36 para 91 cursos que obtiveram tais conceitos. Esses dados denotam uma deficiência na educação brasileira, desde a infantil, embora haja cada vez mais um número maior de alunos, o ensino e capacitação dos profissionais ainda estão muito aquém da desejada e isso reflete também na produção científica brasileira.
As dificuldades enfrentadas pelos pesquisadores
A comunidade científica está aguardando ansiosamente o Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação que investirá cerca de R$ 41 bilhões na área até 2010, o que poderá possibilitar um salto qualitativo na pesquisa científica brasileira, porém não é só o capital que irá possibilitar tal feito.
Segundo indica no seu artigo no caderno “Mais” da Folha de São Paulo, Giovana Girardi acredita que os pesquisadores esperam que se possa derrubar alguns entraves dos quais a comunidade científica está cansada de reclamar.
A burocracia que cerca a importação de material científico e leis que dificultam os estudos da biodiversidade nacional, a criação de Institutos de Pesquisa no país, espalhando-os por regiões que convivem com um vazio científico, como a região Norte são as principais iniciativas propostas pelos pesquisadores brasileiros ao governo federal.
As mudanças para fomentar a produção científica brasileira devem começar por resolver problemas estruturais como a má qualidade do ensino e a ausência de uma postura política que veja no incentivo à pesquisa como fator preponderante para o desenvolvimento social.
Atualmente, a pesquisa científica brasileira corresponde a apenas 2% da produção mundial, ocupando o 15º Lugar, segundo indica a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Em termos qualitativos o desempenho do Brasil é mais tímido, é o 20° colocado, o ranking mede o impacto dos trabalhos publicados, tendo como base o quanto eles são citados por outros trabalhos. O ranking da Capes considerou todos os trabalhos brasileiros publicados em revistas científicas indexadas na base de dados do ISI (Instituto para Informação Científica).
Luiz Eugênio de Mello, pró-reitor de Graduação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) em entrevista a Giovana Girardi, considerou a burocracia como o maior entrave para a pesquisa no Brasil. “Os preços que a gente paga e os prazos que a gente tem de enfrentar são uma das maiores causas do nosso atraso científico. Um americano ou um europeu que precisem de um produto o recebem no dia seguinte.
Aqui leva em média três meses para chegar” complementa. Luiz Eugênio de Mello afirma ainda que aqui no Brasil se considera, por definição, todo mundo como desonesto. As leis têm tantas dobras para evitar isso que no final acabam fomentando a desonestidade e a corrupção, o que se vê são muitos pesquisadores tentam burlar o sistema, contrabandeando.
Integração da pesquisa com o setor produtivo
Em virtude das dificuldades em se realizar pesquisa científica no Brasil e em países em desenvolvimento, se presencia uma emigração de pesquisadores para países com tradição nesse segmento. Segundo estimativa feita pelas Nações Unidas em 2005, quase 40 mil cientistas latino-americanos abandonam anualmente seus países de origem a fim de se instalar em institutos e universidades de nações ricas. Os principais problemas enfrentados por esses profissionais em seus países são os baixos salários, dificuldades para se conseguir financiamento e de se dedicar integralmente à pesquisa.
Uma das maiores deficiências da pesquisa brasileira é ainda o distanciamento dela com o setor produtivo. De acordo com um trabalho recente de Carlos Henrique Brito Cruz, diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), apenas 16% dos pesquisadores brasileiros trabalham em empresas ao passo que em países como os EUA e Coréia do Sul esse percentual chega a 80%.
Os números do trabalho de Brito Cruz indicam que a atividade científica brasileira ainda é exercida preponderantemente pelo setor público. O país investe cerca de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) em Pesquisas e Desenvolvimento (P&D) ainda muito distante da média de 2,24% dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne os países desenvolvidos e alguns emergentes. Apesar desse investimento não satisfatório o Brasil é líder na América Latina.
Do total investido pelo Brasil, 60% é oriundo do setor público, através do financiamento direto do governo ou despesas com o ensino superior. A presença do investimento público torna-se evidente quando, apesar da verba destinada ao segmento representar apenas um terço em relação ao que é gasto pelos países líderes, (Suécia com quase 4% do PIB e Finlândia com 3,5%) a diferença cai abruptamente quando se compara o investimento público na atividade.
Enquanto o setor público brasileiro investe 0,6% do PIB, nos EUA e Suécia este indicador fica entre 0,8% e 1%. No setor privado a diferença é enorme, as empresas brasileiras gastam menos de 0,4% do PIB, em países como a Suécia e o Japão, líder e o vice, respectivamente, gastam entre 2,4% e 2,6%.
Comentário
Para que o Brasil, de fato, se torne uma potência científica, é necessária uma mudança profunda em toda sua estrutura, desde o ensino básico, passando pela desburocratização da política de exportação e importação de material científico e, sobretudo, no que tange o investimento no segmento através da iniciativa privada. As empresas brasileiras ainda não exploram o potencial da interação com institutos de pesquisa e universidades.
O setor privado ainda abriga poucos cientistas, esse problema advém do baixo nível de inovação do setor produtivo nacional, impossibilitando a construção de pontes com o mundo da ciência. O cérebro das empresas continua sendo alojado nas nações ricas e o trabalho braçal, de mão-de-obra, é destinado às nações subdesenvolvidas ou em desenvolvimento, como o Brasil. É necessário acabar com a visão tradicionalista e propiciar que as universidades consigam ir além da pesquisa pura, dando suporte para a inovação na pesquisa e tecnologia no mundo dos negócios.
É inegável que a produção científica cresceu significativamente nos últimos anos, mas o mundo cresceu mais ainda. É de fundamental importância que o governo, as empresas e os pesquisadores possam realizar as mudanças necessárias e fundamentais, fomentando a evolução científica e tecnológica nacional , proporcionando, por conseguinte, o desenvolvimento da sociedade brasileira de forma menos excludente, para que todos os segmentos sociais possam ser beneficiados.